O Brasil se prepara para colher a primeira safra de algodão seguindo os padrões do "better cotton", que visam colocar no mercado fibras produzidas de acordo com critérios de sustentabilidade
O Brasil se prepara para colher a primeira safra de algodão seguindo os padrões do "better cotton", que visam colocar no mercado fibras produzidas de acordo com critérios de sustentabilidade. O projeto-piloto iniciado em quatro Estados do país deverá gerar 42 mil toneladas - volume ínfimo diante da expectativa de 2 milhões de toneladas da fibra este ano. Mas é um começo.
De acordo com a Associação Brasileira dos Produtores de algodão (Abrapa), responsável pela implementação do projeto no país, neste primeiro momento 10 grandes propriedades aderiram ao projeto - quatro em Mato Grosso, quatro em Goiás e duas na Bahia - além de 37 produtores familiares em Minas Gerais, totalizando 27 mil hectares.
"Começamos com poucos produtores, mas eles serão o fermento para outros aderirem", explica Andréa Aragón, coordenadora de sustentabilidade da Abrapa.
Apesar de essas propriedades já terem passado pelo crivo de uma terceira parte independente e, portanto, estarem aptas para colocar no mercado esse novo algodão, a comercialização do BC só deverá ocorrer em 2011/12. Isso porque a maioria da safra de algodão atual já está vendida.
Conhecido internacionalmente pela sigla BCI, de Better Cotton Initiative, a ideia desse algodão foi concebida em 2006 pela organização não governamental de mesmo nome que reúne entre seus membros produtores, indústria, traders e outras ONGs. Atualmente ele é adotado no Brasil, Paquistão, Mali e Índia, com planos de expansão para a China a partir do ano que vem - estratégia compreensível já que o país é o maior produtor e consumidor mundial de algodão.
O BCI determina, por exemplo, a utilização de menos água e pesticidas no plantio e implementa uma colheita rotativa que melhora a qualidade do solo. Além disso, preza relações justas de trabalho e a preservação da natureza. Parece pouco, mas em muitos países em desenvolvimento - onde está uma parte considerável da produção global de algodão - essas recomendações passam longe da realidade.
"Para o Brasil, atender as exigências foi fácil porque a legislação já nos obriga a fazer tudo isso", diz Andréa, alegando que o país tem vantagem competitiva em relação aos concorrentes.
Em 2010/11, a iniciativa global abrangeu 85 mil produtores da Índia, 50 mil do Paquistão, 16 mil em Mali. A ideia é dobrar esse número para 2011/12. No Brasil, foram apenas 10, mas tratam-se de grandes áreas. Por isso, o país é considerado crucial para o sucesso do BCI. "Os outros países não conseguem volume para atender a demanda", afirma Andréa.
"O Brasil certamente puxará esse movimento", diz o trader de algodão Marco Antônio Aluísio, da Interagrícola, do grupo Ecom. Ele diz já ter recebido telefonemas de Bangladesh e da China para encomendas, mas não pode atendê-las já que a fibra que começa a ser colhida no Brasil está praticamente toda contratada.
Segundo ele, a demanda tem aumentado porque os varejistas começam a exigir a inclusão da matéria-prima na composição de seus produtos. A Adidas, por exemplo, anunciou que até 2015 deverá usar algodão BC em 40% de sua produção. Até 2018, a expectativa é que esse material seja usado em 100% dos produtos da marca. Nike, Levis e Ikea anunciaram medidas semelhantes.
Para a WWF Paquistão, parceira do projeto no país, a dificuldade de plantio do algodão orgânico deve incentivar a migração das encomendas das empresas para o BC. O orgânico não permite a aplicação de defensivos, e por isso é mais suscetível a pragas.
Daniel Franciosi, produtor de algodão em Luis Eduardo Magalhães, no oeste da Bahia, diz já ter sido sondado a respeito do BC. "Já teve algumas traders interessadas em comprar da gente, mas eles ainda não querem pagar mais", conta. Com 3,7 mil hectares plantados nesta safra - área de que deve repetir em 2011/12 - e uma média de 300 arrobas por hectare, ele espera receber um diferencial pelo produto.
A questão também pode determinar o ritmo de adesão dos produtores. Oficialmente, o programa BCI não defende o prêmio. O raciocínio é que a sustentabilidade no campo será uma condição básica no comércio, e todos deverão se adequar cedo ou tarde. "Daremos a garantia de compra", defende Aluísio, da Interagrícola, sem mencionar que o mercado de algodão está altamente aquecido - e, portanto, garantia de compra não é mais um benefício.
Nas fazendas, a situação é outra. Neste ano, as associações de produtores de algodão estaduais se responsabilizaram pelos custos de verificação das propriedades rurais, que chega a R$ 3 mil. Na próxima safra, os produtores terão de pagar do próprio bolso.
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