O Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) visa fechar o cerco a
todo e qualquer tipo de informação incorreta que pode ser prestada ao Fisco.
Neste sentido, nem mesmo as entidades imunes e isentas de recolhimento de
impostos e contribuições sociais vão ficar de fora desses processos eletrônicos
em andamento no País.
As instituições imunes são
aquelas desobrigadas do recolhimento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica
(IRPJ). Enquadram-se nessa condição todos os templos de culto religioso, os
partidos políticos e suas fundações e as entidades sindicais, instituições de
educação e de assistência social sem fins lucrativos. Já as isentas total ou
parcialmente do recolhimento do IRPJ e da Contribuição Social Sobre o Lucro
Líquido (CSLL) são as entidades filantrópicas, recreativas, culturais e
científicas, assim como as associações civis sem fins lucrativos.
O que as instituições imunes e
isentas têm em comum é que ambas estão obrigadas a não remunerar seus
dirigentes, ter todos os seus recursos destinados à manutenção e ao
desenvolvimento dos seus objetivos sociais, manter suas receitas e despesas
registradas em livros, conservar por cinco anos — contados a partir da data de
sua emissão — os documentos que comprovem a origem de suas receitas e de suas
despesas. E apresentar, anualmente, a Declaração de Informações
Econômico-fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ).
Como uma das exceções, as
pessoas jurídicas imunes e isentas do Imposto de Renda, cuja soma dos valores
mensais do PIS e da Cofins apurada seja igual ou inferior a R$ 10 mil, estão
dispensadas da apresentação da EFD/Contribuições. Em algumas modalidades do
Sped, entretanto, como o Sped Contábil, as pessoas jurídicas imunes e isentas
terão a obrigação de entregar as informações pelo sistema on-line a partir de
fatos geradores de 2014. “Percebe-se que, nessa linha de fiscalização e
fechamento do cerco pela Receita Federal do Brasil, a fiscalização está se
atentando, inclusive, às entidades imunes e isentas no sentido de realizar os
cruzamentos entre informações de contribuintes que se relacionam comercialmente
com as entidades ou que prestam algum serviço para as mesmas”, explica o
consultor tributário do escritório JCMB Advogados Associados, Alessandro
Machado.
Isso tudo é importante, porque,
caso a Receita Federal fique em dúvida quanto aos valores declarados ou
constate que há irregularidades, é provável que a instituição perca o caráter
de isenção ou imunidade.
Produtor rural
Além disso, o produtor rural pessoa física também terá que se adaptar
às novas determinações fiscais. Isso porque, a primeira fase de implementação
do eSocial (projeto do governo federal que vai unificar o envio de informações
pelo empregador sobre seus empregados) traz justamente a obrigatoriedade de
adaptação para esse grupo de contribuinte e para o segurado especial. “É um
absurdo colocar de cara o produtor rural para atender às novas exigências. O
pequeno produtor rural está preocupado com a chuva, ou a falta dela, e não se
ele está preparado para essa nova situação”, destaca o presidente do Sindicato
das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias,
Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo (Sescon-SP), Sérgio Approbato
Machado Júnior.
“A tecnologia está presente hoje em todas as atividades de uma
empresa. Certamente as companhias instaladas em grandes centros terão menos
dificuldades em atender normas do Sped”, diz o diretor executivo da Confirp
Consultoria Contábil, Richard Domingos. “O problema está fora dos grandes
centros, ou seja, no interior do Brasil, onde a mão de obra na área de
tecnologia é mais escassa e também há mais informalidade nas operações
mercantis”, pondera Domingos.
Transparência nas relações trabalhistas
Gilmara Santos
SÃO PAULO - Mais uma etapa do Sistema Público de Escrituração Digital
(Sped) entra em vigor nos próximos meses. Trata-se do eSocial, que vai unificar
a base de recebimento de dados trabalhistas, previdenciários e tributários,
permitindo o cruzamento de dados, bem como a eliminação gradual de inúmeras
obrigações acessórias atreladas à contratação de colaboradores, sejam estes com
vínculo empregatício ou não. A comunicação dessas informações será feita entre
empresas e órgãos e entidades do governo federal, entre eles Caixa Econômica
Federal, Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Ministério da Previdência
Social (MPS), Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e a Receita Federal do
Brasil.
Se por um lado o projeto do
governo federal vai contribuir para reduzir a burocracia e tornar a relação entre
empregador, governo e trabalhador mais transparente, por outro, muitas
empresas, especialmente as de menor porte, não estão preparadas para atender às
novas demandas do Fisco e torcem para que haja uma prorrogação de prazo. “O
prazo foi escalonado, mas ainda não saiu portaria, por isso, estamos
trabalhando com o prazo de janeiro para as micro e pequenas empresas”, afirma
José Alberto Maia, auditor fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego. Pelo
cronograma atual, essas empresas deveriam atender às novas exigências fiscais a
partir de novembro.
Uma das principais queixas dos
contribuintes é que as regras a respeito da adequação ainda não são claras. “As
empresas têm que fazer a validação de alguns dados, mas essa qualificação ainda
depende de liberação do Fisco”, explica Angela Rachid, gerente de produtos da
ADP Brasil. A expectativa é que em breve isso seja resolvido. “O próprio manual
do sistema no site do eSocial ainda está em fase de elaboração”, observa o
advogado Eduardo Maximo Patrício, do escritório GMP Advogados, ao considerar
que, a longo prazo, ocorrerá diminuição da burocracia no cumprimento das normas
trabalhistas, principalmente com a eliminação de papel e a unificação de banco
de dados. De fato, uma das principais mudanças do eSocial está justamente na
quantidade de informações trabalhistas que as empresas têm que prestar à
administração pública, bem como na eliminação de parte da burocracia no
cumprimento das normas trabalhistas, principalmente no que diz respeito a
preenchimento de formulários e papéis. Hoje a mesma informação é encaminhada
para diversos órgãos, mas, com o novo sistema, a tendência é que não haja mais
necessidade de duplicidade de prestação de contas. Angela Rachid concorda que o
sistema terá impacto positivo no combate às práticas irregulares. “As empresas
vão ter que se preocupar mais em arrumar os seus processos internos. Este
sistema não vai ser positivo para quem vive na irregularidade”, comenta, estimando que vai levar cerca de dois anos
para que o eSocial esteja totalmente estabilizado. “Daqui a dois ou três anos,
a relação entre empresa, trabalhador e governo terá uma nova cara”, destaca a
representante da ADP Brasil.
Preocupação
“Mas há uma preocupação das empresas quanto à prestação de informações
conciliadas. Considerando que o eSocial abrange informações sobre folha de
pagamento e obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais, vários
departamentos das empresas, como RH, contabilidade, fiscal, etc., serão
requisitados a produzir informações que, em muitos casos, não são conciliadas
por falha de sistemas internos de apuração”, alerta a advogada Cintia Ladoani
Bertolo, do escritório Bergamini Collucci Advogados.
Outro fato que traz preocupação
é que, com o eSocial, todas as informações sobre os trabalhadores devem estar
atualizadas. Porém há uma grande parte de contribuintes com problemas de
cadastro e é preciso acertar esses dados antes de ser empregado. “A Previdência
Social, a Receita Federal e o INSS estão preparados para atender a esses
milhões de trabalhadores num prazo curto?”, questiona Márcio Massao Shimomoto,
sócio-diretor da King Contabilidade.
Cronograma
O prazo começa em abril e vale
para produtor rural pessoa física e segurado especial. Na sequência, em junho,
devem se adaptar às novas regras empresas tributadas pelo lucro real. Em
novembro é a vez das empresas tributadas pelo lucro presumido, entidades imunes
e isentas, optantes pelo regime especial unificado de arrecadação de tributos e
empresas de pequeno porte e microempresas optantes pelo Supersimples,
Microempreendedor Individual (MEI), contribuinte individual equiparado a
empresa; e em janeiro de 2015 os órgãos da administração direta (União,
estados, Distrito Federal e municípios), bem como suas autarquias e fundações.
Sped exige investimento em capacitação
SÃO PAULO - Boa parte das etapas do Sistema Público de Escrituração
Digital (Sped) já está em vigor, mas muitas empresas ainda têm grande
dificuldade em se adaptar às novidades. Primeiro porque não há regras claras
para todos os processos, depois porque o custo para a implementação das
mudanças é alto e muitas empresas, principalmente as pequenas, não dispõem de
caixa suficiente para adquirir ou fazer as adaptações necessárias em seus
sistemas. Sem contar que, muitas vezes, firmas de menor porte nem têm equipes
específicas em suas estruturas para cuidar dessa área. Neste cenário, os
contadores aparecem como importantes aliados dos empresários e têm papel de
destaque na implementação de todas as fases do sistema, especialmente para as
micro e pequenas empresas, já que muitas delas dependem desses profissionais
para cumprir as obrigações com o Fisco. “O Sped é um projeto feito para os
contribuintes e, como nós, contabilistas e contadores, atendemos 90% dos
contribuintes, temos papel muito importante em todo este processo”, afirma o presidente
do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de
Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo
(Sescon-SP), Sérgio Approbato Machado Júnior .
O auditor Claudio Filippi, presidente do Conselho Regional de
Contabilidade do Estado de São Paulo (CRC-SP) e sócio da
PricewaterhouseCoopers, ressalta que o profissional da contabilidade tem a
expertise e conhecimentos necessários à implantação e monitoramento das
informações que serão disponibilizadas. “O conhecimento profissional é
necessário para atender às novas exigências do Fisco”, destaca. No entanto, é
bom não esquecer que, mesmo contando com o apoio do contador, a obrigação de
atender às determinações impostas pelo Fisco é do contribuinte, lembra Filippi.
“Caso ocorra algum atraso ou divergência de informação, são as próprias
empresas que podem ser penalizadas”, completa.
Qualificação
Os profissionais da contabilidade, cientes do papel nas várias etapas
desse processo, estão buscando conhecimento, capacitação no uso dos sistemas e
na melhoria dos equipamentos para se adequarem às mudanças. “O profissional da
contabilidade deve investir em capacitação e conhecimento, necessidade que
sempre existiu em sua trajetória profissional”, destaca o presidente do CRC-SP.
“A implantação do Sped representa muitos ganhos, em termos de redução
de burocracia e agilidade nos procedimentos, mas sua efetivação vai impactar a
atividade dos contabilistas, especialmente os que atuam nas pequenas empresas.
Portanto, é necessário que os profissionais estejam qualificados para esse novo
cenário da contabilidade no Brasil”, afirma Jair Gomes de Araújo, presidente do
Sindicato dos Contabilistas de São Paulo (Sindcont-SP).
O fato é que, mesmo sem ter todas as suas fases implementadas, o Sped
já traz grande preocupação, principalmente aos pequenos empreendedores, e
trabalho extra para os contabilistas. Algumas empresas que não têm o sistema de
nota fiscal implantado, por exemplo, já recorrem a esses profissionais para
fazer o lançamento dos seus documentos fiscais. E com a entrada em vigor do
eSocial, o trabalho dos contabilistas tende a aumentar ainda mais.
“Com a implementação do eSocial, serão 2.450 campos de registro para
cada item de funcionário que precisam ser preenchidos”, explica o presidente do
Sescon-SP. “Num primeiro momento do Sped, o trabalho desses profissionais será
maior”, esclarece o representante do CRC-SP.
Todos estes procedimentos representam custo adicional para esses
prestadores de serviços, que nem sempre pode ser repassado para os clientes. O
representante do Sescon-SP esclarece que não há como contabilizar os custos
extras que as empresas de contabilidade terão para se adaptarem às novas
regras. “Mas há um custo de investimento em profissionais para se atualizarem e
também nos sistemas”, garante.
Impacto
As mudanças no sistema de prestação de contas ao Fisco têm se
refletido de forma negativa, especialmente nos pequenos escritórios de
contabilidade, segundo Approbato. Ele conta que já há casos de profissionais de
contabilidade que estão deixando o mercado de trabalho por não conseguirem se
adaptar às novas regras.Isso ocorre, entre outros motivos, porque há
necessidade de altos investimentos em reciclagem profissional e em tecnologia,
o que nem sempre as pequenas empresas podem suportar. “Tem pequenas empresas de
contabilidade que estão fechando os seus escritórios e negociando suas
carteiras de clientes”, afirma o presidente do Sescon-SP. Além disso, ele conta
que os bons profissionais que ainda estão no mercado são cada vez mais
requisitados.
Para ele, o conceito do Sped é
interessante, mas a forma como foi implementado está causando impacto negativo
no dia a dia das empresas e, consequentemente, no trabalho dos profissionais da
contabilidade. “O governo não divulgou como isso vai mudar a vida das empresas
e faltou também sensibilidade para oferecer uma linha de crédito para melhorar
ou trocar o sistema de gestão e de controle interno das empresas”, considera
Approbato. “Cada empresa terá a sua realidade, de acordo com seu atual nível de
sistema e equipamentos disponíveis e, dependendo desse nível, o investimento
não será pequeno”, considera o presidente do CRC-SP.
Approbato afirma ainda que
faltou consulta, por parte do governo, às pequenas empresas – as que enfrentam
maior dificuldade para se adequar às mudanças. E lembra que apenas as grandes
companhias participaram dos projetos-pilotos para implementação do sistema.
Na avaliação do presidente do
Sescon-SP, a questão da infraestrutura é outro empecilho para a implementação
efetiva do sistema. “Em algumas cidades ainda não há acesso à banda larga e os
arquivos são transmitidos por meio de internet discada. Há casos de
profissionais que ficam durante a madrugada tentando enviar os arquivos, porque
na hora de mandar, com tudo pronto, a internet trava”, diz Approbato.
Fonte: DCI – SP